27 de ago. de 1994

Miséria escolar

Publicado originalmente na Folha de S. Paulo em 27/8/1994

O desempenho escolar do Brasil está muito aquém do que seria economicamente possível e socialmente necessário. No caderno “Brasil 95” de 31 de julho, a Folha resume relatório da Unicef mostrando que o Brasil apresenta o pior desempenho escolar no nível fundamental quando tomadas como referência as possibilidades econômicas. Mas não é só nesse nível que a tragédia se manifesta.

Segundo o relatório da Unicef de 94, apenas Guiné Bissau e Haiti apresentam percentuais de matriculados na 1ª série que concluem o 1º grau inferiores ao Brasil. Segundo o relatório da Unesco de 92, o Brasil era o campeão sul-americano em analfabetismo infantil.
Entre os países com renda per capita comparável à brasileira, apenas a Venezuela apresenta taxa de matrícula no 2º grau inferior à nossa e apenas Trinidad e Tobago apresenta taxa de matrícula no ensino superior inferior à brasileira.
A raiz do problema é a falta de compromisso efetivo com o desenvolvimento econômico, social e cultural dos governos ditatoriais e, mais recentemente, do governo Collor/Itamar. Essa falta de compromisso é manifestada nos arrochos orçamentários impostos aos setores educacionais e à sua privatização criminosa, fatos que transformaram a educação escolar em um instrumento a mais em favor da exclusão e do lucro.
Como conseqüência de uma maquiagem orçamentária e desorganização contábil, o Brasil é o único país a não ter informado jamais à Unesco os gastos correntes com educação. Um levantamento baseado em informações oficiais e trabalhos de pesquisadores na área educacional permite estimar os gastos públicos correntes com educação escolar no Brasil em apenas cerca de 2,6% do PIB.
A educação escolar é um processo longo. Cuba, Japão, República da Coréia, Argélia, Egito e China são exemplos de países que fizeram ou estão fazendo grandes esforços na escolarização de suas populações e servem para mostrar que os frutos só são colhidos quatro ou cinco décadas depois de iniciado o processo. Como o Brasil não está sequer preparado para iniciar esse percurso, nossa escala de tempo é ainda maior.
Acreditar que o Brasil em breve atingirá os padrões de desenvolvimento de países emergentes não tem fundamento. Não fossem inúmeros outros problemas, a grave crise escolar brasileira seria suficiente para nos amarrar firmemente a um Quarto Mundo, onde a fome, a miséria e a alienação convivem com os devaneios primeiro mundistas das elites que cunharam essa situação.

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