31 de ago. de 2011

Educação, dez por cento do PIB

Artigo publicado originalmente no jornal Brasil de Fato, n. 443, de 25 a 31 de agosto de 2011

    No final da década de 1990, um grande conjunto de entidades comprometidas com o desenvolvimento da educação construiu uma proposta de Plano Nacional de Educação, conhecido como PNE da Sociedade Brasileira (PNE-SB) . Esse Plano foi apresentado ao Congresso Nacional na forma de um projeto de lei assinado por mais de 70 parlamentares e encabeçado pelo deputado federal (SP) Ivan Valente, então no PT.
Uma das propostas contidas no PNE-SB dizia respeito à necessidade de financiamento, estimada, então, em 10% do PIB. Neste momento em que a defesa dos 10% do PIB para a educação é adotada por inúmeras entidades comprometidas com a educação nacional, vale a pena examinar alguns aspectos referentes à origem daquele valor e as possibilidades reais do país arcar com isso.

    Os 10% do PIB não foram “tirados da cartola”. Durante a elaboração do PNE-SB, avaliou se em que situação nossa educação se encontrava, definiram-se as metas a serem atingidas e os prazos para isso. Usando alguns parâmetros bem definidos (por exemplo, os investimentos necessários por estudante ano e o número de crianças, jovens e adultos a serem atendidos), estimou se o volume de recursos necessário. (Detalhes dos cálculos aparecem na referência citada.) Daí surgiram os 10% do PIB. Não por coincidência, os países que acumulavam atrasos educacionais como os nossos e os superaram aplicaram cerca de 10%, ou mais, de seus PIBs na educação pública.
O PNE atualmente proposto pelo executivo federal prevê investimentos que, na melhor das hipóteses, chegariam aos 7% do PIB e propõe metas incompatíveis com esse valor, como a universalização da educação dos 4 aos 17 anos, a conclusão do ensino fundamental para todos, o atendimento de 50% das crianças de até 3 anos de idade e o oferecimento de educação em tempo integral para boa parte dos estudantes das escolas públicas. Além disso, é necessário melhorar a infraestrutura das escolas, aumentar os salários dos trabalhadores na educação, ampliar os programas de gratuidade ativa etc. Mesmo os 10% do PIB seriam insuficientes para cumprir as metas do PNE proposto.
É importante observar que investir 10% em educação é perfeitamente viável do ponto de vista econômico e não fruto do delírio de esquerdistas radicais ou educadores sonhadores. Vejamos. De 2003 a 2010, o PIB brasileiro cresceu cerca de 37% em termos reais. Se o equivalente ao crescimento médio de um único ano tivesse sido concentrado no setor educacional, já teríamos atingido as condições necessárias de financiamento para superar nossos atrasos.
Devemos lembrar que quando se reivindica uma maior participação da educação no PIB, não se está a subtrair alguma coisa dele. Dito de forma mais explícita: a construção civil teria sido aquecida, mas com um maior volume destinado às instalações escolares; a renda média da população também teria crescido, mas com uma maior concentração na forma de aumento salarial dos trabalhadores em educação; o emprego formal também teria aumentado, por contratação de mais professores e educadores; o consumo de papel e material impresso, de energia elétrica, de veículos, de vestimentas, de equipamentos eletrônicos de todos os tipos e de tudo o mais que é produzido no país também teriam crescidos, mas mais concentradamente no setor educacional. Portanto, aumentar os investimentos em educação não disputa espaço com o crescimento econômico, ao contrário, incrementa-o e o redireciona para uma área de maior relevância social e econômica.
Um dos graves problemas do Brasil hoje é a sustentação do crescimento da economia e um dos entraves é o baixo nível de formação da nossa força de trabalho. Como os investimentos em educação têm taxas de retorno (aumento do PIB em relação aos investimentos feitos) muito altas, levam vantagem quando comparados com investimentos em outros setores da economia e se pagariam em poucos anos. Além disso, mais e melhor educação traz ganhos sociais e culturais que poderiam contribuir para superar uma das maiores vergonhas nacionais: a concentração de renda. Mas elevar os investimentos públicos a 10% do PIB choca-se com os interesses capitalistas mais mesquinhos e imediatistas, pois implica em retirar de seu controle uma parte dos recursos, ainda que muito pequena. Esses recursos seriam administrados pelo setor público e, característica típica do setor educacional, com uma margem de democracia e participação, embora ainda insuficientes, muito maiores do que aquela existente na administração empresarial privada. Aí está a fonte das dificuldades que enfrentamos.
Portanto, vamos intensificar a luta pelos 10% do PIB para a educação pública, já!



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