17 de jul. de 1989

Educação e renda no Brasil

Publicado originalemnte na Folha de S. Paulo em 17 de agosto de 1989


Uma das características mais perversas do capitalismo brasileiro é a má distribuição de renda. O processo de concentração de renda nas mãos de poucos e a consequente pauperização de grande parte da população atingiu um recorde histórico na década de 70. Naquela época, os 10% mais privilegiados da população eram cerca de 70 vezes mais ricos que os 10% mais pobres. E esse recorde não é só histórico, mas também mundial.
 Nos países socialistas e social-democratas, os 10% mais ricos da população são cerca de cinco vezes mais ricos que os 10% mais pobres; em países como EUA, Canadá ou Alemanha essa razão é cerca de dez vezes mais. Poucos países do terceiro Mundo apresentam uma distribuição de renda tão desigual quanto a brasileira e pouquíssimos (Honduras, México, e Peru, na América Latina, e Gabão, Zâmbia e Zimbábue, na África, entre os mais significativos) apresentam uma distribuição de renda ainda pior que a nossa.
Entre os fatores que contribuem para esta situação está a educação escolar. Um dos mecanismos que acopla educação com distribuição de renda é a desuniformidade da escolarização, a qual cria um ambiente social de desigualdades tanto para a competição pelo mercado de trabalho como pela preparação intelectual para enfrentar a realidade e influir sobre ela. E essa desuniformidade na escolarização aumentou ao longo da década de 70, como mostra a tabela. Nesse período chegou mesmo a haver uma diminuição da taxa de escolarização entre os mais jovens (7 e 9 anos entre 1970 e 1977), enquanto a taxa de escolarização daquela faixa da população mais escolarizada aumentava contínua e significativamente.
Outro mecanismo que acopla escolarização com renda é a mútua dependência entre elas. De um lado a renda depende da escolarização. De outro, a escolarização das crianças e dos jovens depende fortemente da renda familiar. Famílias cuja renda per capita é da ordem de meio salário mínimo por mês não garantirão, em média, mais que três anos de escolaridade aos seus filhos, enquanto famílias com renda per capita de cerca de dois salários mínimos terão filhos cuja escolaridade média será de cerca de 6 anos. Assim, renda e escolarização se realimentam perversamente, contribuindo para reproduzir em anos futuros a má distribuição de renda atual.
Mantido o atual modelo educacional brasileiro, paulista inclusive, com o abandono do ensino público, desvalorização salarial dos profissionais da educação, oferta insuficiente de vagas e falta de condições de estudo por parte dos segmentos mais carentes da sociedade, perpetuar-se a atual subescolarização da população e manter-se-ão as condições que permitem que o Brasil seja hoje um dos recordistas mundiais do analfabetismo e da má distribuição de renda.

TAXA DE ESCOLARIDADE
(Por faixa etária, no Brasil)





1970
1977
1979




Total
49%
51%
56%
7 – 9 anos
65%
62%
73%
10 – 14 anos
71%
75%
81%
15 – 19 anos
38%
43%
47%
20 – 24 anos
16%
19%
20%
Fonte: Anuários Estatísticos do IBGE (1987-88)

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