Publicado originalmente na Folha de S. Paulo, em 27/7/2019
A
educação a distância e todos os demais recursos que possam favorecer os
processos de ensino e aprendizagem devem ser e têm sido incorporados ao sistema
educacional. Entretanto, a forma que a educação a distância se implantou no
Brasil a distorceu de tal maneira que, com poucas exceções, tem se mostrado
mais danosa do que benéfica.
O que ocorre no ensino superior de
graduação dá uma ideia dessa distorção. A cada ano, são oferecidas perto de
quatro milhões de vagas de ingresso nesse nível educacional, enquanto o número
de concluintes do ensino médio é da ordem de dois milhões. A metade!
Evidentemente, há algo muito errado e isso se deve à desproporcional
privatização do ensino superior no Brasil, totalmente em desacordo com o que
ocorre nos demais países. Por causa disso, o ensino superior, nas mãos de um
empresariado ambicioso, virou uma mercadoria ofertada sem qualquer critério:
são oferecidos cursos de baixíssimo retorno (ou sem qualquer retorno) e distribuídos
sem nenhuma consideração quanto às necessidades regionais do país ou das
diferentes profissões. Em muitos casos, apenas os critérios mercadológicos, que
consideram a existência de clientela e de sua capacidade de pagar pela mercadoria
oferecida, são levados em conta.
O ensino a distância no Brasil não
surgiu como alguma coisa complementar ou adicional ao ensino presencial; ele
surgiu quer como uma forma de substitui-lo, quer como uma possibilidade
adicional de negócio. Evidência disso é a enorme quantidade de vagas de
ingresso no ensino superior a distância, da mesma ordem de grandeza que o
número de vagas para os cursos presenciais, totalizando, as duas modalidades,
nada menos do que quatro vezes mais do que o número de concluintes do ensino
médio.
Se há
carências de mestres e doutores engajados na pesquisa científica e no ensino
superior no país, não é por falta de pessoas formadas, mas, sim, por causa da
desorganização do sistema. Estender o ensino a distância à pós-graduação, em
nada vai contribuir para a melhoria do sistema educacional e da produção
cultural e científica do país. A educação, inclusive em nível de pós-graduação,
depende, além das aulas, das atividades presenciais, tais como debates,
seminários, discussões na frente de uma lousa ou em torno de uma mesa, presença
em laboratórios, interação entre estudantes e a interação destes com
pesquisadores e professores.
Repetindo,
o ensino a distância pode ser um complemento ao ensino presencial e responder a
demandas específicas. Entretanto, poucas são as pessoas que se adaptam a ele,
muitas não conseguem organizar seu tempo de forma adequada, outras, ainda, não
têm espaço e ambiente adequado para estudo. Esses fatores, bem como a
impossibilidade de troca de experiências com colegas, dificuldades para acessar
computadores e não adaptação ao método têm sido apontados como responsáveis
pelas enormes taxas de abandono na educação a distância.
Docentes,
pesquisadores e instituições sérias de ensino superior sabem usar os recursos
da educação a distancia de forma adequada. Deixar que essa modalidade seja
ainda mais explorada por instituições privadas que já se mostraram incapazes de
oferecer adequadamente o ensino presencial apenas piorará ainda mais a educação
no país..
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